quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Residuos

Resta-me a fragrância da tua pele
em mim colada, à exaustão
dos dias que se escoaram
por entre os dedos finos da minha mão.

A noite veio e desvirgindou
todo o pudor que ali morreu
por entre sonhos já vividos,
e tantos outros que ninguém sonhou!

Ah! como pesa a tua ausência
neste silêncio feito pedra!
Traz-me a voz que murmura cânticos
que vagam nas ondas da minha essência.

Não vivo já, espectro de mim
dorme acordado em ténue vigília...
Vem madrugada, vem de uma vez
e traz de volta a noite e outro dia assim.

Dói-me o corpo inteiro, retoco a alma
retalhos do meu triste deambular.
Hoje, não sou ninguém, esqueci a calma
quero apenas dormir para não mais acordar !


Carmen Sêco

U2 - With Or Without You

http://www.youtube.com/watch?v=XmSdTa9kaiQ&feature=relmfu

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Nocturno

Amor, não sei de coisa mais violenta
que ficar de noite à tua espera.
É triste como uma manhã cinzenta
destruindo o coração da primavera.

E aqui, como um pássaro deitado,
julgando ouvir na chuva a tua voz,
a madrugada deita-se a meu lado
fingindo que na cama estamos nós.

Mas eu sinto chegar esta amargura
que vem fechar-me os olhos. E depois,
já nem sei se é um sonho ou se é loucura:
no quarto onde estou só, ficamos dois.

E nada mais me importa, já não espero
aquela que enche a noite de alegria.
Então, para dizer quanto te quero,
eu faço amor contigo até ser dia.

Joaquim Pessoa

De joelhos

«Bendita seja a Mãe que te gerou.»
Bendito o leite que te fez crescer.
Bendito o berço aonde te embalou
A tua alma, pra te adormecer!

Bendita essa canção que acalentou
Da tua vida o doce alvorecer...
Bendita seja a Lua, que inundou
De luz, a Terra, só para te ver...

Benditos sejam todos que te amarem,
As que em volta de ti ajoelharem
Numa grande paixão fervente e louca!

E se mais que eu, um dia, te quiser
Alguém, bendita seja essa Mulher,
Bendito seja o beijo dessa boca!!

Florbela Espanca

Miriam Makeba - Pata Pata (live 2006) HQ

http://www.youtube.com/watch?v=E0Oj6ScoL_M&feature=related

O teu desenho

Aprendi a desenhar-te,
sem te ver,
sem querer,
sem te conhecer,

Mas a tua voz,
adivinha-te os traços,
Guia-me no riscar
das tuas linhas,
Ajuda-me a encontrar-te
as sombras,
A apagar-te os defeitos
a medir-te os espaços,

E quando já não falas,
me apareces,
em figura esboçada,
como silhueta,
como esfinge,
como beleza desenhada.


José Gabriel Duarte

Muitas vezes te esperei, perdi a conta

Muitas vezes te esperei, perdi a conta,
longas manhãs te esperei tremendo
no patamar dos olhos. Que importa
que batam à porta, façam chegar
jornais, ou cartas, de amizade um pouco
- tanto pó sobre os móveis tua ausência.

Se não és tu, que me importa?
Alguém bate, insiste através da madeira,
que me importa que batam à porta,
a solidão é uma espinha
insidiosamente alojada na garganta.
Um pássaro morto no jardim com neve.

Fernando Assis Pacheco

Zulu Song - Miriam Makeba

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=k27LiD3YDZ4#!

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Ode a Eros

Eros, Cupido, Amor, pequeno Deus travesso
Com quem todos brincamos!
Brincando nos ferimos,
Ferindo-nos gozamos,
Se rimos já choramos,
Mal que choramos rimos...
Já, voltados do avesso,
Por igual o voltamos,
O torturamos nós como ele nos tortura,
Descemos aos recessos da criatura...

Pequenino gigante!
Sonhava, ou não sonhava,
Quem te representou risonho e pequenino
Que de Hércules a clava
Não pesa como pesa a tua mão de infante,
Nem seu furor destrói
Como nos dói
Teu riso de menino?

Nas tuas leves setas
Nas flâmulas gentis
Que cantam os poetas
E os namorados juvenis,
Que longos ópios e letais licores,
Que pântanos de lodo e que furores,
Que grinaldas de louros e de espinhos,
Que abissais labirintos de caminhos!

Mascarilha de seda e de veludo
Sob a qual o olhar brilha, a boca ri,
Que olhar ambíguo ou mudo,
Que boca atormentada
Não terás além ti
Na mascarada?

Pai da Crueldade e da Piedade,
Filho do Crime e da Beleza,
Que infante serás tu, que, desde que há Idade,
Aos Ícaros opões a mesma astral parede,
E os Lázaros susténs dos restos dessa mesa
Em que se bebe sempre a mesma sede,
Se come
A mesma fome?

Divindade nocturna
Que te cinges de rosas,
Suprema fúria mascarada
Que a porta abres do céu... escancarada
Sobre o negro vazio duma furna,
Que a urna de cristal nas mãos formosas
Vens ofertar às bocas sequiosas
E escorres sangue do cristal da urna,
Que tens tu afinal, ao fundo da caverna
Sempre aos mortais vedada:
A eterna morte... o nada,
Ou a vida eterna?


José Régio

Vem comigo

vem comigo
ver as pirâmides fantásticas do vento
no interior luminoso da terra encontrarás
o segredo de quartzo para desvendares o tempo
onde contemplamos a fulva doçura das cerejas

iremos para onde os restos de vida não acordem
a dor da imensa árvore a sombra
dos cabelos carregados de pólenes e de astros
crescemos lado a lado com o dragão
o súbito relâmpago dos frutos amadurecendo
iluminará por um instante as águas do jardim
e o alecrim perfumará os noctívagos passos
há muito prisioneiros no barro
onde o rosto se transforme e morre
e já não nos pertence

vem comigo
praticar essa arte imemorial de quem espera
não se sabe o quê junto à janela
encolho-me
como se fechasse uma gaveta para sempre
caminhasse onde caiu um lenço
mas levanto os olhos
quando o verão entra pelo quarto e devassa
esta humilde existência de papel

vem comigo
as palavras nada podem revelar
esqueci-as quase todas onde vislumbro um fogo
pegando fogo ao corpo mais próximo do meu


Al Berto

Amor Electro - A Máquina

http://www.youtube.com/watch?v=tnBccuIDTTw

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Vida

Já perdoei erros quase imperdoáveis,
tentei substituir pessoas insubstituíveis
e esquecer pessoas inesquecíveis.

Já fiz coisas por impulso,
já me decepcionei com pessoas
que eu nunca pensei que iriam me decepcionar,
mas também já decepcionei alguém.

Já abracei pra proteger,
já dei risada quando não podia,
fiz amigos eternos,
e amigos que eu nunca mais vi.

Amei e fui amado,
mas também já fui rejeitado,
fui amado e não amei.

Já gritei e pulei de tanta felicidade,
já vivi de amor e fiz juras eternas,
e quebrei a cara muitas vezes!

Já chorei ouvindo música e vendo fotos,
já liguei só para escutar uma voz,
me apaixonei por um sorriso,
já pensei que fosse morrer de tanta saudade
e tive medo de perder alguém especial (e acabei perdendo).

Mas vivi!
E ainda vivo!
Não passo pela vida.
E você também não deveria passar!


Viva!!

Bom mesmo é ir à luta com determinação,
abraçar a vida com paixão,
perder com classe
e vencer com ousadia,
porque o mundo pertence a quem se atreve
e a vida é muito para ser insignificante.

Augusto Branco

As palavras que eu digo

As palavras que eu digo
sobre o aroma das flores
são palavras às cores,
que na minha alma respiro
e é nelas que cheiro,
que recordo e que vivo.

Como marinheiro em terra preso,
em minha mente navego
nas memórias agitadas
por vagas de pensamentos
levadas pelos ventos
à terra dos sentimentos
no coração atracado.

Cada porto de abrigo
é uma história que se conta
de um homem nascido,
tendo tudo vivido
que se faz das palavras que eu digo.

José Maria Almeida

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Amo-te, Amor!

Chegas-me
nos sorrisos que lançaste
das janelas fechadas
entre olhares furtivos
trocados na madrugada
enquanto todos dormiam
o nosso sonho encantado.

Chegas-me
no aroma que deixaste
naquela flor murcha
que abandonaste
à porta da minha casa
naquele dia que te foste
e mais nada deixaste.

Chegas-me
na letra desenhada
daquela carta que escreveste
e onde me disseste
porque me abandonaste
sozinho no espaço
da cama que criaste.

Não, não te foste ainda embora
pois na tristeza da memória
que em mim deixaste
sinto ainda o amor
que nunca abandonaste
como uma flor
que vive em mim.

José Maria Almeida

Ronny Jordan - So What

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=4B5Q6HH8DbI#!

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Guerra Civil

É contra mim que luto.
Não tenho outro inimigo.
O que penso
O que sinto,
O que digo
E o que faço
É que pede castigo
E desespera a lança no meu braço.

Absurda aliança
De criança
E adulto,
O que sou é um insulto
Ao que não sou;
E combato esse vulto
Que à traição me invadiu e me ocupou.

Infeliz com loucura e sem loucura,
Peço à vida outra vida, outra aventura,
Outro incerto destino.
Não me dou por vencido,
Nem convencido.
E agrido em mim o homem e o menino.

Miguel Torga

domingo, 4 de dezembro de 2011

Sou de outras coisas

Sou de outras coisas
pertenço ao tempo que há-de vir sem ser futuro
e sou amante da profunda liberdade
sou parte inteira de uma vida vagabunda
sou evadido da tristeza e da ansiedade

Sou doutras coisas
fiz o meu barco com guitarras e com folhas
e com o vento fiz a vela que me leva
sou pescador de coisas belas, de emoções
sou a maré que sempre sobe e não sossega

Sou das pessoas que me querem e que eu amo
vivo com elas por saber quanto lhes quero
a minha casa é uma ilha é uma pedra
que me entregaram num abraço tão sincero

Sou doutras coisas
sou de pensar que a grandeza está no homem
porque é o homem o mais lindo continente
tanto me faz que a terra seja longa ou curta
tranco-me aqui por ser humano e por ser gente

Sou doutras coisas
sou de entender a dor alheia que é a minha
sou de quem parte com a mágoa de quem fica
mas também sou de querer sonhar o novo dia

Fernando Tordo

il Divo - Regresa A Mi

http://www.youtube.com/watch?v=Yay4W9hkJJM

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Esquece-te de mim, Amor

Esquece-te de mim, Amor,
das delícias que vivemos
na penumbra daquela casa,
Esquece-te.
Faz por esquecer
o momento em que chegámos,
assim como eu esqueço
que partiste,
mal chegámos,
para te esqueceres de mim,
esquecido já
de alguma vez termos chegado.

António Mega Ferreira

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Poema da despedida

Não saberei nunca
dizer adeus

... ... Afinal,
só os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo

Mia Couto

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Aurora Bureal

Tenho quarenta janelas
nas paredes do meu quarto.
Sem vidros nem bambinelas
posso ver através delas
o mundo em que me reparto.
Por uma entra a luz do Sol,
por outra a luz do luar,
por outra a luz das estrelas
que andam no céu a rolar.
Por esta entra a Via Láctea
como um vapor de algodão,
por aquela a luz dos homens,
pela outra a escuridão.
Pela maior entra o espanto,
pela menor a certeza,
pela da frente a beleza
que inunda de canto a canto.
Pela quadrada entra a esperança
de quatro lados iguais,
quatro arestas, quatro vértices,
quatro pontos cardeais.
Pela redonda entra o sonho,
que as vigias são redondas,
e o sonho afaga e embala
à semelhança das ondas.
Por além entra a tristeza,
por aquela entra a saudade,
e o desejo, e a humildade,
e o silêncio, e a surpresa,
e o amor dos homens, e o tédio,
e o medo, e a melancolia,
e essa fome sem remédio
a que se chama poesia,
e a inocência, e a bondade,
e a dor própria, e a dor alheia,
e a paixão que se incendeia,
e a viuvez, e a piedade,
e o grande pássaro branco,
e o grande pássaro negro
que se olham obliquamente,
arrepiados de medo,
todos os risos e choros,
todas as fomes e sedes,
tudo alonga a sua sombra
nas minhas quatro paredes.

Oh janelas do meu quarto,
quem vos pudesse rasgar!
Com tanta janela aberta
falta-me a luz e o ar.

António Gedeão

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

És a página em branco

És a página em branco que viro com a respiração
Corpo leve ao respirar esta essência da partilha
do ar que consumimos
Boca na boca respiro-te

Descubro-te na solidez dos dedos ágeis
Página em branco que preencho com os braços
envoltos na espessa neblina do arfar
Braço no braço escrevo-te

És a criação da liberdade em movimento
És a palavra liberta em redor do corpo
Marfim talhado na robustez da descoberta
Palavra a palavra crio-te

No perpetuar dos dias escorre o suor da vida
esse áspero mar que nos carrega
e me convida a escrever escrever continuamente
em todo o recanto da tua branca página

José Bernardes

Et si tu n'existais pas

http://www.youtube.com/watch?v=bHUH8cP7p90

E se você não existisse,
Diga-me porque eu existiria.
Para andar por esse mundo sem você,
Sem esperança e sem saudades.
E se você não existisse,
Eu tentaria inventar o amor,
Como um pintor que vê de seus dedos
Nascer as cores do dia.
E que não voltam.
E se você não existisse,
Diga-me porque eu existiria.
Pessoas adormecidas em meus braços,
Que eu jamais amaria.
E se você não existisse,
Eu não seria mais que um ponto a mais,
Nesse mundo que vem e que vai,
Eu me sentiria perdido,
Teria necessidade de você.
E se você não existisse,
Diga-me como eu existiria.
Poderia fingir que seria eu,
Mas nunca seria verdadeiro.
E se você não existisse,
Eu acredito que eu teria encontrado,
O segredo da vida, o por quê,
Simplesmente para te criar,
E para te olhar.

domingo, 13 de novembro de 2011

Ode a Heros

Eros, Cupido, Amor, pequeno Deus travesso
Com quem todos brincamos!
Brincando nos ferimos,
Ferindo-nos gozamos,
Se rimos já choramos,
Mal que choramos rimos...
Já, voltados do avesso,
Por igual o voltamos,
O torturamos nós como ele nos tortura,
Descemos aos recessos da criatura...

Pequenino gigante!
Sonhava, ou não sonhava,
Quem te representou risonho e pequenino
Que de Hércules a clava
Não pesa como pesa a tua mão de infante,
Nem seu furor destrói
Como nos dói
Teu riso de menino?

Nas tuas leves setas
Nas flâmulas gentis
Que cantam os poetas
E os namorados juvenis,
Que longos ópios e letais licores,
Que pântanos de lodo e que furores,
Que grinaldas de louros e de espinhos,
Que abissais labirintos de caminhos!

Mascarilha de seda e de veludo
Sob a qual o olhar brilha, a boca ri,
Que olhar ambíguo ou mudo,
Que boca atormentada
Não terás além ti
Na mascarada?

Pai da Crueldade e da Piedade,
Filho do Crime e da Beleza,
Que infante serás tu, que, desde que há Idade,
Aos Ícaros opões a mesma astral parede,
E os Lázaros susténs dos restos dessa mesa
Em que se bebe sempre a mesma sede,
Se come
A mesma fome?

Divindade nocturna
Que te cinges de rosas,
Suprema fúria mascarada
Que a porta abres do céu... escancarada
Sobre o negro vazio duma furna,
Que a urna de cristal nas mãos formosas
Vens ofertar às bocas sequiosas
E escorres sangue do cristal da urna,
Que tens tu afinal, ao fundo da caverna
Sempre aos mortais vedada:
A eterna morte... o nada,
Ou a vida eterna?

José Régio

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Canção Perdida

Hálitos de lilás, de violeta e d'opala,
Roxas macerações de dor e d'agonia,
O campo, anoitecendo e adormecendo, exala...
Triste, canta uma voz na síncope do dia:

Alguém de mim se não lembra
Nas terras d'além do mar...
Ó Morte, dava-te a vida,
Se tu lha fosses levar!...

Ó Morte, dava-te a vida,
Se tu lha fosses levar!...
Com o beijo do sol na face cadavérica,
Beijo que a morte esvai em palidez algente,

Eis a Lua a boiar sonâmbula e quimérica...
Doce canta uma voz melancolicamente:
O meu amor escondi-o
Numa cova ao pé do mar...

Morre o amor, vive a saudade...
Morre o sol, olha o luar!...
Morre o amor, vive a
Morre o Sol, olha o luar!...

Latescente a neblina opálica flutua,
Diluindo, evaporando os montes de granito
Em colossos de sonho, extasiados de Lua...
Flébil, chora uma voz no letargo infinito:

Quem dá ais, ó rouxinol,
Lá para as bandas do mar?...
É o meu amor que na cova
Leva as noites a chorar!...


A Lua enorme, a Lua argêntea, a Lua calma,
Imponderalizou a natureza inteira,
Descondeusou-a em fluido e embebeceu-a em alma...
Triste expira uma voz na canção deerradeira:

Ó meu amor, dorme, dorme
Na areia fina do mar,
Que em antes da estrela d'alva
Contigo me irei deitar!...

Que em antes da estrela d'alva
Contigo me irei deitar!

Guerra Junqueiro

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Father and son

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=QEhM6e8dK-w

Realidade

Em ti o meu olhar fez-se alvorada
E a minha voz fez-se gorjeio de ninho...
E a minha rubra boca apaixonada
Teve a frescura pálida do linho...

Embriagou-me o teu beijo como um vinho
Fulvo de Espanha, em taça cinzelada...
E a minha cabeleira desatada
Pôs a teus pés a sombra de um caminho...

Minhas pálpebras são cor de verbena,
Eu tenho os olhos garços, sou morena,
E para te encontrar foi que eu nasci...

Tens sido vida fora o meu desejo
E agora, que te falo, que te vejo,
Não sei se te encontrei... se te perdi...

Florbela Espanca

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Nos teus braços

Nos teus braços,
Morreria
Se ontem fosse amanhã.
Morreria
Por gostar
Da maneira como gostas,
Se caísse em teus braços.
Se os meus braços vacilassem,
Evitaria o teu olhar.
E morreria outra vez
Para poder ter
O motivo de te encontrar.
Nos teus braços,
Morreria.
Novamente…

Paulo Eduardo Campos

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Dedication To My Ex (Miss That)

http://www.youtube.com/watch?v=CrQAdM581Pk&feature=player_embedded

Em ti

Em ti o chão exausto de meu desejo. A flor aberta
dos sentidos. A calidez do lume. A água. O vinho.
O sangue a estuar em fúria. O grito do sol
que em transe de labareda fulge e irradia.
A extensão de tantos vales
e colinas. Fragrantes. Infinitas.
Os pomos saborosos, repartidos.
Os gomos. Os sumos ardorosos.
Os bosques impregnados de maresia.
A placidez molhada das ervas.
O luzir loiro das searas pelo vento devastadas.
O estio. O seu zénite. A sua vertigem.

Em ti a inclinação dos ramos. A translucidez do verde.
O derrame da seiva. O estremecer das raízes.
O musgo despontando. O aveludado dos troncos.
Os álamos. Os plátanos. E outras núbeis melodias.
O espreguiçar incandescente dos rios.
O êxtase das aves altas anunciando o fervor
de um beijo. De um afago. De uma carícia.
O hálito das corolas. As sépalas. Os estames.
O brilho e o odor silvestre da resina. A relva sedosa.
A primavera inebriada com sua própria brisa.

Em ti o menear da terra. As eiras. O feno flamante.
O irromper dos brotos. O despertar dos cálices.
A embriaguez do nardo. E da acácia, festiva.
O matiz das cores na várzea repercutido.
O som dos mananciais posto a descoberto.
O manar das fontes em euforia.
Os céus azuis a derramarem hinos.
O trinado agudo da andorinha.
O acenar obstinado dos choupos.
As centelhas rubras do crepúsculo.
O perfume juvenil das vinhas.

Em ti o delírio das ondas. Das espumas.
As fogueiras ateadas. Os aromas fulvos.
O sopro das chamas. O pão aceso. As espigas.
Os campos de lilases que se estendem
numa queimadura de aurora.
As pétalas humedecidas.
O incêndio azul do orvalho.
A alvura da açucena na manhã florida.

Em ti, amada, celebro a memória de todas as coisas vivas.

 

Gonçalo Salvado

Have You Ever Seen The Rain?

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=Gu2pVPWGYMQ#!

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Recordar é Viver

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=d4W_zRGrLG8

Talvez um dia...

Talvez um dia eu parta
para essa viagem sem fim,
sem saber por onde passei,
nem os trilhos que pisei.

Talvez um dia eu parta,
feche os olhos e adormeça,
sem me ter sentido acordado,
que não errante e atordoado.

Talvez um dia eu parta,
me livre da angústia e nostalgia,
e encontre a serenidade,
quiçá, a suprema felicidade.

Talvez um dia quem sabe
olhe para trás e entenda,
no fim do caminho que percorro,
tudo o que hoje me interrogo.

Talvez um dia quem sabe
acabe com a maldição,
o sentir amado e não amar,
porque deixei de lutar.

Talvez um dia quem sabe
eu aprenda a conhecer-me,
talvez então tarde demais,
para viver entre os mortais.

Olho para trás e que vejo?
Buracos negros deixados
e intervalos de vida sem cor,
um vazio enorme… muita dor.

Talvez um dia eu parta,
vista a vida de negro
e a leve nessa viagem,
último suspiro… uma miragem.

Celso Cordeiro

Acordo

Acordo. dormes ainda.
Que fazer se me apetece?
Pego na tua mão
e pouso-a onde estou vivo.
respiras. Andantino.
As costas para mim. Não resisto.
Os dedos, leves, ensalivados,
vão a procura do grão, do seu
pólen. Vão e vêm, vou e venho.
Beijo-te no ombro. Sorris.
Dormes ainda? Subitamente
abres os olhos e abres a boca
e debruças-te sobre mim.
O dia principia.

Casimiro de Brito

Pezinhos...

terça-feira, 25 de outubro de 2011

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

DIA 146

Era uma vez duas vezes. E como não há duas sem três,
algum castigo tens guardado para mim. Não sei se me
roubarás os livros, se me esconderás os melros, se me
negarás os beijos. Alguma coisa destas tu farás.
Podes roubar-me os livros.
Hei-de recuperá-los, verso a verso, como a aranha que
reconstrói a teia, como o pensamento que reconstrói a
ideia, como o vento que reconstrói a duna.
Podes esconder-me os melros.
Saberei cantar. Darei asas à minha esperança para a ver
poisar em todos os verdes, brilhar em todos os muros,
debicar todos os desejos.
Não me negues os beijos.
Morrerei de fome. E de sede. E de saudade.
Morrerei de te ver e não te ter.
Morrerei de não morder a tua boca.
Morrerei de não viver.
Morrerei.

Joaquim Pessoa

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O meu amor existe

O meu amor tem lábios de silêncio
e mãos de bailarina
e voa como o vento
e abraça-me onde a solidão termina

O meu amor tem trinta mil cavalos
a galopar no peito
e um sorriso só dela
que nasce quando a seu lado eu me deito

O meu amor ensinou-me a chegar
sedento de ternura
sarou as minhas feridas
e pôs-me a salvo para além da loucura

O meu amor ensinou-me a partir
nalguma noite triste
mas antes, ensinou-me
a não esquecer que o meu amor existe

 

Jorge Palma

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Procuro-te...

Será por isso que só me sinto bem ao pé do mar. Procuro-te nas algas, nos destroços que boiam nas ondas, nos testos de naufrágio sobre a areia, em todas as praias batidas pelo vento. Às vezes vejo-te passar nas nuveus negras, nas que vêm do sul para onde partiste um dia, nas que são empurradas pelo vento do Norte e vêm da fronteira, junto à Galiza, para onde, noutros verões, costumavas ir de férias. Só o mar me traz o teu sabor, a tua mão, o cheiro do teu corpo, que é um cheiro a madressilva e às ervas das areias. Procuro-te nas pedras que podem trazer-me um sinal. É sobretudo no inverno que as praias desertas são a paisagem natural da tua ausência-presença. É então que gosto de passear na Barra de Aveiro, olhar o ângulo convexo do paredão norte com os dois braços da Ria, fixar um ponto segundo regras que os ventos me ensinaram, esperar que o sol e as nuvens reflictam nas águas a sombra do teu rosto.

Manuel Alegre

Brinquedo

Foi um sonho que eu tive:
Era uma grande estrela de papel,
Um cordel,
E um menino de bibe.

O menino tinha lançado a estrela
Com ar de quem semeia uma ilusão;
E a estrela ia subindo, azul e amarela,
Presa pelo cordel à sua mão.

Mas tão alto subiu
Que deixou de ser estrela de papel
E o menino, ao vê-la assim, sorriu
E cortou-lhe o cordel.

Sophia de Mello Breyner Andresen

terça-feira, 18 de outubro de 2011

O burro

Um dia, um burro caiu num poço e não podia sair dali. O animal chorou fortemente durante horas, enquanto o seu dono pensava no que fazer. Finalmente, o camponês tomou uma decisão cruel: concluiu que já que o burro estava muito velho e que o poço estava mesmo seco, precisaria de ser tapado de alguma forma. Portanto, não valia a pena esforçar-se para tirar o burro de dentro do poço. Chamou então os ...............seus vizinhos para o ajudar a enterrar vivo o burro. Cada um deles pegou uma pá e começou a atirar terra para dentro do poço. O burro entendeu o que estavam a fazer e chorou desesperadamente. Até que, passado um momento, o burro pareceu ficar mais calmo. O camponês olhou para o fundo do poço e ficou surpreendido. A cada pá de terra que caía sobre ele o burro sacudia-a, dando um passo sobre esta mesma terra que caía ao chão. Assim, em pouco tempo, todos viram como o burro conseguiu chegar até ao topo do poço, passar por cima da borda e sair dali. A vida vai atirar muita terra para cima de ti. Principalmente se já estiveres dentro de um poço. Cada um dos nossos problemas pode ser um degrau que nos conduz para cima. Podemos sair dos buracos mais profundos se não nos dermos por vencidos. Usa a terra que te atiram para seguir em frente!

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Pensamento do dia!!!

"Só percebemos o milagre da vida quando deixamos que o inesperado aconteça"

Paulo Coelho

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Os meus versos

Rasga esses versos que eu te fiz, Amor!
Deita-os ao nada, ao pó, ao esquecimento,
Que a cinza os cubra, que os arraste o vento,
Que a tempestade os leve aonde for!

Rasga-os na mente, se os souberes de cor,
Que volte ao nada o nada de um momento!
Julguei-me grande pelo sentimento,
E pelo orgulho ainda sou maior!...

Tanto verso já disse o que eu sonhei!
Tantos penaram já o que eu penei!
Asas que passam, todo o mundo as sente...

Rasgas os meus versos... Pobre endoidecida!
Como se um grande amor cá nesta vida
Não fosse o mesmo amor de toda a gente!...

 

Florbela Espanca

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Rastos...

Prefiro acreditar

Era noite e eu caminhava
Pela areia e imaginava
Memórias da vida no céu,
E pegadas à beira da água
Que eu contava, admirado.
Seriam passos do passado,
Ou Deus que caminhava ao meu lado?

Era noite e eu recordava
Os dias de sofrimento e mágoa
Em que não encontrei companhia
E a areia só mostrava
O rasto da minha melancolia.
Não via as pegadas de Deus,
Os passos que via eram só meus.

Tinhas-me prometido
Que se tomasse este caminho
Caminharias a meu lado
Mas quando a dor foi maior
E olhei em redor
Mais solitário me senti
E tão solitárias as pegadas que vi.

Prefiro acreditar
Que nos dias de sofrimento e mágoa
Desenhados junto à água
Esses solitários passos
Afinal não eram meus
Eram as pegadas de Deus
Que me carregava nos seus braços.

Carlos Campos (adaptação de Mary Stevenson)

Crazy Alarm Clock Animation

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=5ZfQiDrs8bc

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Because I Got High

http://www.youtube.com/watch?v=WeYsTmIzjkw

Labirinto

Labirinto ou não foi nada
Talvez houvesse uma flor
aberta na tua mão.
Podia ter sido amor,
e foi apenas traição.

É tão negro o labirinto
que vai dar à tua rua. . .
Ai de mim, que nem pressinto
a cor dos ombros da Lua!

Talvez houvesse a passagem
de uma estrela no teu rosto.
Era quase uma viagem:
foi apenas um desgosto.

É tão negro o labirinto
que vai dar à tua rua...
Só o fantasma do instinto
na cinza do céu flutua.

Tens agora a mão fechada;
no rosto, nenhum fulgor.
Não foi nada, não foi nada:
podia ter sido amor.


David Mourão Ferreira

Soneto inglês

Como o silêncio do punhal num peito,
O silêncio do sangue a converter
Em fio breve o coração desfeito
Que nas pedras acaba de morrer.

Vive em mim o teu nome, tão perfeito
Que mais ninguém o pode conhecer!
É a morte que vivo e não aceito;
É a vida que espero não perder.

Viver a vida e não viver a morte;
Procurar noutros olhos a medida,
Vencer o tempo, dominar a sorte,

Atraiçoar a morte com a vida!
Depois morrer de coração aberto
E no sangue o teu nome já liberto...

Alexandre O´Neill

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Evian Roller Babies international version

http://www.youtube.com/watch?v=XQcVllWpwGs

Uma das manhãs

Rente à manhã, sinto uma leve brisa.
Suave e fresca. Acaricia-me.
O dia descobre-me aos poucos, beijando-me,
e eu sou um, entre tantos que desperta.

Docemente me beija a pele adormecida,
sem pudor, desperta-me a virilidade,
assustada, de incontidas noites desejada.
Num alvoroço de luas peregrinas.

A meu lado, o amor ainda dorme.
Tão nua, num desapego lírico de se ver.
Aveludado, meu afago a percorre,
deixando adormecer minha mão,
no ventre luminoso de perdão.

Estremece um pouco; na vã tentativa
de encobrir, desfolhada rosa, que,
meus dedos no orvalho se inquietam.

Lentamente os seios despontam ao raiar,
num leve acariciar dos lábios.
Docemente sorri: afastando-me a mão.
{que agora não; ainda não despertou o coração}

Joaquim Monteiro

Rio triste

Longuíssimos braços têm
os olhos que tudo abraçam.
Somente, só os olhos vêem
os olhos que por mim passam.

Clandestinamente os lanço,
braços de mar, olhos de água.
Longo ser líquido avanço,
abraço a vida, e alago-a.

Destino do amor triste
que não se ouve nem se vê.
ama apenas porque existe.
Não sabe a quem nem porquê.

Nesta obrigação de estar
que a cada um de nós cabe,
coube-me esta de amar.
E ninguém sabe.

António Gedeão

Knockin On Heavens Door

http://www.youtube.com/watch?v=2tmc8rJgxUI

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Pensamento do dia!!!

"O amor não tem idade; está sempre a nascer."

Blaise Pascal

Como é que se Esquece Alguém que se Ama?

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguem antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar.
É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.
Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha.
Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.
O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.


Miguel Esteves Cardoso

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Pensamento do dia!!!

A vida é curta

Wish You Were Here

http://www.youtube.com/watch?v=QCQTr8ZYdhg

Tempo de poesia

Todo o tempo é de poesia.

Desde a névoa da manhã
à névoa de outro dia.

Desde a quentura do ventre
à frigidez da agonia.

Todo o tempo é de poesia.

Entre bombas que deflagram.
Corolas que se desdobram.
Corpos que em sangue soçobram
Vidas que a amar se consagram.

Sob a cúpula sombria
das mãos que pedem vingança.
Sob o arco da aliança
da celeste alegoria.

Todo o tempo é de poesia.

Desde a arrumação do caos
à confusão da harmonia.

António Gedeão

Ecos

Em voz alta, ensaiei o teu nome:
a palavra partiu-se
Nem eco ínfimo neste quarto
quase oco de mobília

Quase um tempo de vida a dormir
a teu lado e o desapego é isto:
um eco ausente, uma ausência de nome
a repetir-se

saber que nunca mais: reduzida
a um canto desta cama larga,
o calor sufocante

Em vez: o meu pé esquerdo
cruzado em lado esquerdo
nesta cama

O teu nome num chão
nem de saudades

Ana Luísa Amaral

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

The Adventures of Rain Dance Maggie

http://www.youtube.com/watch?v=RtBbinpK5XI

Pensamento do dia!!!

"Só existem dois dias no ano em que não podes fazer nada pela tua vida: Ontem e amanhã"

Dalai Lama

Até amanhã

Sei agora como nasceu a alegria,
como nasce o vento entre barcos de papel,
como nasce a água ou o amor
quando a juventude não é uma lágrima.

É primeiro só um rumor de espuma
à roda do corpo que desperta,
sílaba espessa, beijo acumulado,
amanhecer de pássaros no sangue.

É subitamente um grito,
um grito apertado nos dentes,
galope de cavalos num horizonte
onde o mar é diurno e sem palavras.

Falei de tudo quanto amei.
De coisas que te dou para que tu as ames comigo:
a juventude, o vento e as areias.

Eugénio de Aandrade

Canção de amor

Eu cantaria mesmo que tu não existisses,
faria amor, assim, com as palavras.
Eu cantaria mesmo que tu não existisses
porque haveria de doer-me a tua ausência.

Por isso canto. Alegre ou triste,canto.
Como se, cantando, tocasse a tua boca,
ainda antes da tua presença.
Direi mesmo, depois da tua morte.

Eu cantaria mesmo que tu não existisses,
ó minha amiga, doce companheira.
Eu festejo o teu corpo como um rio,
onde, exausto, chegarei ao mar.

Sim, eu cantaria mesmo que tu não existisses,
porque nada eu direi sem o teu nome.
Porque nada existe além da tua vida,
da tua pele macia, dos teus olhos magoados.

Assim quero cantar-te meu amor,
para além da morte, para além de tudo.

Joaquim Pessoa

When You're Gone

http://www.youtube.com/watch?v=RUmdWdEgHgk

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Preguiça...

Teoria do Amor

Amor é mais do que dizer.
Por amor no teu corpo fui além
e vi florir a rosa em todo o ser
fui anjo e bicho e todos e ninguém.

Como Bernard de Ventadour amei
uma princesa ausente em Tripoli
amada minha onde fui escravo e rei
e vi que o longe estava todo em ti.

Beatriz e Laura e todas e só tu
rainha e puta no teu corpo nu
o mar de Itália a Líbia o belvedere.

E quanto mais te perco mais te encontro
morrendo e renascendo e sempre pronto
para em ti me encontrar e me perder.

Manuel Alegre

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

A dor que se deseja!

Fecho as pernas
por entre os braços que me abraçam,
cerro os olhos
e ouço apenas o coração
ritmado dentro do peito,
ouço as águas do ribeiro
beijando as margens verdejantes,
ouço as minhas lágrimas;

E calo-me,
calo-me em ti.

A felicidade também dói,
o amor dói,
a paixão dói.

Afagas-me o rosto com a ponta dos dedos
e há um sorriso encantador que te marca as faces,
tremo as mãos
e o coração quer rasgar-se por dentro.

Sinto a areia molhada onde me sento
e acomodo melhor o corpo,

Pincelo na areia o teu nome
e deixo que a espuma das águas o envolva…
partilho-te…
e partilho-te com o vento,

O relógio parou no meu pulso
para que o tempo se eternize em nós.

A felicidade também dói,
o amor dói,
a paixão dói,

Mas dói no outro lado do peito

 

Francisco Valverde Arsénio

Esfera

http://www.youtube.com/watch?v=huN7vpydWUQ

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Pensamento do dia!!!

A maioria dos homens emprega a primeira metade de sua vida a tornar a segunda metade miserável.

(Jean de La Bruyère)

As férias de.... virão



Canção da alegria

Há um pássaro que voa
Sobre as janelas do dia
Fugiu do meu peito
Poisou no meu leito
E fez
Um ninho de alegria.

Alegria que nasceu
De uma rosa quase pura
Meu amor dormindo
Nesta noite abrindo
Em flor
A minha ternura.

Tenho sede de viver
Tenho a vida à minha espera
Sou uma rosa a crescer
No azul da primavera.

Tenho sede de viver
De fazer amor contigo
Quantas vezes eu quiser
Amante, amor e amigo.

Há palavras que regressam
Como um beijo à minha boca
Para possuir-te
Para pertencer-te
A noite
Será sempre pouca.

 

Joaquim Pessoa

Nos teus olhos alguém anda no mar

Nos teus olhos alguém anda no mar
alguém se afoga e grita por socorro
e és tu que vais ao fundo devagar
enquanto sobre ti eu quase morro.

E de repente voltas do abismo
e nos teus olhos há um choro riso
teu corpo agora é lava e fogo e sismo
de certo modo já não sou preciso.

Na tua pele toda a terra treme
alguém fala com Deus alguém flutua
há um corpo a navegar e um anjo ao leme.

Das tuas coxas pode ver-se a Lua
contigo o mar ondula e o vento geme
e há um espírito a nascer de seres tão nua.

Manuel Alegre

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Pensamento do dia!!!

"Faci quod potui, faciant meliora potents"

(Aforisma Latino)

Olhinhos...

Jogo

Eu, sabendo que te amo,
e como as coisas do amor são difíceis,
preparo em silêncio a mesa
do jogo, estendo as peças
sobre o tabuleiro, disponho os lugares
necessários para que tudo
comece: as cadeiras
uma em frente da outra, embora saiba
que as mãos não se podem tocar,
e que para além das dificuldades,
hesitações, recuos
ou avanços possíveis, só os olhos
transportam, talvez, uma hipótese
de entendimento. É então que chegas,
e como se um vento do norte
entrasse por uma janela aberta,
o jogo inteiro voa pelos ares,
o frio enche-te os olhos de lágrimas,
e empurras-me para dentro, onde
o fogo consome o que resta
do nosso quebra-cabeças.

Nuno Júdice

Conquista

Livre não sou, que nem a própria vida
Mo consente.
Mas a minha aguerrida
Teimosia
É quebrar dia a dia
Um grilhão da corrente.

Livre não sou, mas quero a liberdade.
Trago-a dentro de mim como um destino.
E vão lá desdizer o sonho do menino
Que se afogou e flutua
Entre nenúfares de serenidade
Depois de ter a lua!

Miguel Torga

Segredo

Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo tem lá dentro um passarinho
Novo.
Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

Miguel Torga

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Pensamento do dia!!!

"Não acrescente dias a sua vida, mas vida aos seus dias."

Harry Benjamin

Relax

http://www.youtube.com/watch?v=ShbC5yVqOdI

Do outro lado da porta

Quero

Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vida
de meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.

Ouvindo-te dizer: Eu te amo,
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte,
como sabê-lo?

Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
pois ao dizer: Eu te amo,
dementes
apagas
teu amor por mim.

Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.
Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra
e na sua emissão,
amor
saltando da língua nacional,
amor
feito som
vibração espacial.

No momento em que não me dizes:
Eu te amo,
inexoravelmente sei
que deixaste de ama-me,
que nunca me amaste antes.

Se não me disseres urgente repetido
Eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor.

Carlos Drummond de Andrade

Tenho saudades de uma dama

Tenho saudades de uma dama
como jamais houve na cama
outra igual, e mais terra amante.
Não era sequer provocante.
Provocada, como reagia!
São palavras só: quente, fria.
No banheiro nos enroscávamos.
Eram flamas no preto favo,
um guaiar, um matar-morrer.
Tenho saudades de uma dama
que me passeava na medula
e atomizava os pés da cama.

Carlos Drummond de Andrade

Ainda que mal

Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano: amor.

Carlos Drummond de Andrade

Ausência

Eu haverei de erguer a vasta vida
que ainda é o teu espelho:
cada manhã hei-de reconstrui-la.
Desde que te afastaste,
quantos lugares se tornaram vãos
e sem sentido, iguais
a luzes acesas de dia.
Tardes que te abrigaram a imagem,
música em que sempre me esperavas,
palavras desse tempo,
terei de as destruir com as minhas mãos.
Em que ribanceira esconderei a alma
p'ra que não veja a tua ausência,
que como um sol terrível, sem ocaso,
brilha definitiva e sem piedade?
A tua ausência cerca-me
como corda à garganta.
O mar ao que se afunda.

Jorge Luís Borges

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Hotel California - Eagles

http://www.youtube.com/watch?v=PFqkb9BlHkI

Simples amor

Amo uma menina pura como o mel,
aos meus olhos ela é esplêndida,
doce e meiga, mas muito fiel.

Tentar quantificar este sentimento
é tarefa impossível
quanto mais penso nela, maior é o alento

de querer estar peito a peito,
a ela abraçado e sem jeito
de me afastar desta morena irresistível.

Ela é a minha inspiração,
a minha canção,
assim consigo parar para pensar,

o que seria do meu coração
se não a tivesse perto do meu?
Acho que não teria mais nenhuma palpitação!

Rui Salema

A verdadeira paixão

Nutro por ti uma profunda paixão,
cá dentro sinto esse sentimento
de amor e carinho com emoção,
penso em ti a cada momento.

és a mulher do meu pensamento,
a princesa do meu deslumbramento,
a sereia do meu encantamento,
a menina do meu contentamento.

Em cada dia que passa, aumenta a minha paixão,
cada hora parece uma eternidade,
Em cada minuto mais sinto saudade,
Em cada segundo mais bate o meu coração.

És a madeira da minha fogueira,
o combustível do meu automóvel,
o aquecedor que me dá o calor,
a alegria da minha poesia.

Rui Salema

A arte de amar

Quem no amor
não sabe dar,
nele, felicidade
não pode almejar.

Para desviar a dor,
amar é agradar,
é não avançar a idade,
aproveitando para cortejar.

É necessário saber ceder,
importante é compreender
que o amor é intensidade
que a tudo tem prioridade.

Não subestimes a sua imponência,
não desprezes a sua capacidade,
nem reduzas a sua imensidão.

Se de amor sentes carência,
deves então conter a ansiedade
e no coração ilumina a escuridão.

Amar é descobrir,
é dar asas à emoção,
é o coração abrir
e sentir a sua locomoção.

Amar é o melhor desejar,
é o melhor poder dar.
Amar é emanar afecto,
é trepar do chão ao tecto.

O amor desconhece barreiras,
ultrapassa fronteiras,
percorre nações inteiras
e ateia grandes fogueiras.

Amor é um nóbil sentimento,
é um afectuoso nascimento,
de carinho e estima,
por alguém que está acima.

Gostar de alguém
é lembrança persistente,
é ternura comovente,
a quem queremos bem.

Rui Salema

Pensamento do dia!!!

"Raramente conhecemos alguém de bom senso, além daqueles que concordam connosco."

François La Rochefoucauld

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

What A Little Bit Of Love Can Do

http://www.youtube.com/watch?v=YS_2P1DnNWE

O metralha...

Declaração de Amor

Gosto de ti como és,
da cabeça até aos pés,
quando me abraças
a minha calma embaraças.

Amar-te é corar,
é o coração alegrar,
é fazer o tempo parar.

Tu és pérola diferente,
és sensibilidade interior,
tens ternura comovente
e chama superior.

Tu és encanto gracioso,
és amor grandioso,
és calor gostoso.

Por ti posso o ar agarrar,
tesouros da terra desenterrar,
o mundo inteiro fazer parar.

amar-te é querer estar perto,
desejar-te é ficar à noite desperto,
agradar-te é deixar o coração aberto,
adorar-te é nunca ficar descoberto,
e contigo estar sempre coberto.

Por ti o meu corpo anseia,
por ti o sangue ferve na veia,
é a ti que o meu beijo premeia.

Acredita neste meu coração,
que bate louco, louco de emoção.
Acredita na minha cabeça,
que de ti não há jeito que esqueça.

 

Rui Salema

À espera do Amor

O amor enche-te o peito,
com ele ultrapassas a dor,
conquistas muito respeito
e tornas-te falador.

Sente-o a pingar no interior,
aproveita o seu calor,
admira a sua cor
sente o seu requintado sabor.

O amor é força que alenta,
confiança que não apoquenta,
é um sentimento sem igual,
que te vai dar um querer nada frugal.

Para sentir o amor verdadeiro,
à que saber aguardar,
o amor, esse não vai tardar,
espera-o calmo e ordeiro.

Ele far-te-á sonhar,
pelos céus vais voar,
o teu lar, irás partilhar
e a vida vais iniciar.

Com o amor ouves doçura,
ele termina com a procura,
acredita que também cura
e ficas com a alma segura.

É satisfação permanente,
que a cabeça e o corpo sente,
é desejar sem querer,
acarinhar sem esquecer.

O amor é uma necessidade constante,
é aquilo que se torna o mais importante,
é uma quietude premente,
uma atitude urgente.

 

Rui Salema

Venho conhecer o teu interior

Aos céus eu falo,
e de lá eu vejo e não me calo,
a beleza da tua alma,
fascina-me essa tua calma,
que o teu tocar me faz desejar.

Vem, olha para este meu pranto
diz-me se é bonito o meu canto,
que tudo faz para te conquistar,
tudo maneio para te abraçar,
e o meu corpo calar.

Vem, sente a minha proximidade,
de ti, da tua alma, de ti,
passa a mão pelo meu ar,
este ar que um sorriso desarma,
sente-me já na minha intimidade.

Traz-me esse teu corpo doce como o mel,
toca-me como a caneta faz ao papel,
diz-me então o que sentes quando me tocas,
derrete esse desejo que arde ai dentro
e explica-me as trocas que a tua cabeça faz ao relento.

És para mim pureza refinada,
recatada, mas à alma confinada,
quando estou de ti perto,
um portão à frente abre,
é certo que o teu peito tudo sabe.

É ele que me segreda uma bela composição,
é ele que me enche de tom,
é o bater desse puro coração,
que o meu reconhece o som e o tocar,
primando o teu calor e o teu mar, par a par.

Toco-te nesse teu amado peito,
fico sem jeito, mas os teus olhos eu fito,
ritmados com a vida damos um abraço perfeito,
inundados de amor verdadeiro, nós namoramos,
beijos trocamos e verdades incendiamos, neste lume que cá dentro deitamos.

Trocamos fluidos tépidos, que cá dentro lubrificam,
são as nossas línguas que encostamos e assim ficam,
é com as nossas mãos que partes do corpo tacteamos,
é com as minhas doces palavras que eu te faço aquecer até quase derreter,
calor teu que me levanta a moral e a tua imagem a minha cabeça quer reter.

Podes estar à vontade, liberta toda essa energia, que o teu corpo emana,
sente esta minha filosofia que a tua cabeça norteia,
e este meu empenho que te abana e a tua boca sons ateia,
vigor e rigidez exterior que acolhe a libido interior fundamental,
colados e juntos permanecemos enquanto eu te rego, minha flor especial.


Rui Salema

Pensamento do dia!!!

“As oportunidades são como o nascer do sol: se esperares demais, vais perdê-las.”

William George Ward

Olá vida...

A noite desce...

Como pálpebras roxas que tombassem
Sobre uns olhos cansados, carinhosas,
A noite desce... Ah! doces mãos piedosas
Que os meus olhos tristíssimos fechassem!

Assim mãos de bondade me embalassem!
Assim me adormecessem, caridosas,
E em braçadas de lírios e mimosas,
No crepúsculo que desce me enterrassem!

A noite em sombra e fumo se desfaz...
Perfume de baunilha ou de lilás,
A noite põe-me embriagada, louca!

E a noite vai descendo, muda e calma...
Meu doce Amor, tu beijas a minh'alma
Beijando nesta hora a minha boca!

 

Florbela Espanca

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Poema do silêncio

Sim, foi por mim que gritei,
Declamei,
Atirei frases em volta.
Cego de angústia e de revolta.

Foi em meu nome que fiz
A carvão, a sangue, a giz,
Sátiras e epigramas nas paredes
Que eu não vi serem necessárias e vós vedes.

Foi quando compreendi
Que nada me dariam do infinito que pedi,
Que ergui mais alto o meu grito,
E pedi mais infinito!

Eu, o meu eu rico de vícios e grandezas,
Foi a razão das épi-trági-cómicas empresas
Que, sem rumo,
Alevantei com ironia, sonho, e fumo...

O que eu buscava
Era, como qualquer, ter o que desejava.
Febre de Mais, ânsias de Altura e Abismo
Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.

E só por me ter vedado
Sair deste meu ser pequeno e condenado,
Erigi contra os céus o meu imenso Engano,
De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!

Senhor meu Deus em que não creio!
Nu a teus pés abro o meu seio:
Procurei fugir de mim,
Mas eu bem sei que sou o meu único fim.

Sofro, assim, pelo que sou,
Sofro por este chão que aos pés se me pegou,
Sofro por não poder fugir,
Sofro por ter prazer em me acusar e em me exibir!

Senhor meu Deus em que não creio porque és minha criação!
(Deus, para mim, sou eu - sou eu chegado à perfeição...)
Senhor! dá-me o poder de estar calado,
Imóvel, manietado, iluminado!

Se os gestos e as palavras que sonhei,
Nunca os usei nem usarei,
Se nada do que eu levo a efeito vale,
Que eu me não mova! que eu não fale!

Também sei bem que embora trabalhando só por mim,
Era por um de nós. E assim,
Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade,
Lutava um homem pela humanidade.

Mas o meu sonho megalómano é maior
Que a própria dor
De compreender como é supremamente egoísta
A minha máxima conquista!

Senhor! que nunca mais meus versos sôfregos e impuros
Me rasguem, e meus lábios cerrarão como dois muros,
E o meu silêncio, como incenso, atingir-te-á,
E sobre mim de novo descerá...

Sim, descerá da tua mão compadecida,
Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida:
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome
Saciarão a minha fome!

José Régio

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Pensamento do dia!!!

"O caminho da verdade é único e simples; o da falsidade, vário e infinito."

Pe. Antônio Vieira

Mama...

Rio triste

Longuíssimos braços têm
os olhos que tudo abraçam.
Somente, só os olhos vêem
os olhos que por mim passam.

Clandestinamente os lanço,
braços de mar, olhos de água.
Longo ser líquido avanço,
abraço a vida, e alago-a.

Destino do amor triste
que não se ouve nem se vê.
ama apenas porque existe.
Não sabe a quem nem porquê.

Nesta obrigação de estar
que a cada um de nós cabe,
coube-me esta de amar.
E ninguém sabe.

António Gedeão

Esboço

Desenho o esboço
do teu corpo
no meu modo imaginário
de ser,
doce
redondo
dado.
São traços da minha forma
de te querer,
detalhes
que as nossas cartas jogam
E do que sabes
E do que sei,
são as coisas que trocamos.
os traços seguem as linhas,
pecados desta linha
que nos separa,
nos torna virtuais.
E quando me pedes
que me dê de ti
é para mim que voltas
nesse amor frágil,
inconsolável
de te ter longe
aqui mesmo ao pé de mim.

Jorge Bicho

Quem disse que o teu nome é uma espada

http://www.youtube.com/watch?v=9rYkMmLpTcw

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Poema para ti

Não me perguntes por que te amo
pergunta-me antes, por que não te amaria
e eu te responderei:
— Não te amaria, se não houvesse em ti
este sol por despertar, esta sede por matar,
e esta interminável doçura que te habita.

Eu já te amava e te adorava
antes mesmo da invenção da palavra.

Creio que não sabes,
mas tu és esta chama fria
esperando ser encarnada
na alma...És este sentir
que constrói mundos
e move corações...

Não me perguntes por que te amo
pergunta-me sim, o quanto te amo
e eu te responderei:
— Não existe palavra tão intensa
em que caibas completamente, pois tu és
este vazio ainda por preencher, o qual não se
basta nunca...

Sabes,
por vezes um simples olhar teu
desperta um lento fogo em mim
que sem demora enche-me de atrasos
e logo sei o quanto estás distante...
Mas não te preocupes
que em meu olhar
ainda reluzem as tuas pegadas
denunciando-te sob o horizonte...

Eusébio Sanjane -Poeta Moçambicano

Fofuras...

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A beleza de um sorriso

Ao encontrar-te, sorri.
Há muito que o não fazia.
Perdida entre lamentos e lutas,
Entre tristezas e angustias,
Minha alma já chorava
E meu coração lamentava
A ausência dum sorriso.
Havia uma criança em mim,
Uma mulher por encontrar,
Um sonho por realizar
E os dias por vencer.
Contigo, venci os dias,
Reencontrei a paz e a calmaria
E a beleza de um sorriso
Que há muito andava perdido.
Contigo a meu lado entendi
Que sem sorriso não há beleza.
Ele afugenta a tristeza e devolve-nos o sentir.
Ao encontrar-te, sorri,
Porque por fim entendi,
Na tua força e no teu amor,
As razões para sorrir.

Alice Ruivo

Alma

A minha alma anda triste
Quem foi que a entristeceu
Alguém a quem amo muito
Desta forma me pagou

São tantas as vezes que me fere
Isto tinha de acabar
A corda tanto esticou
que de esticar quebrou

Sempre tenho perdoado
Mas tudo tem um limite
O perdão acabou
O meu sossego chegou

Pessoa que tanto me fere
Que tanto abusa de mim
Só sirvo quando precisa
O resto do tempo me pisa

Amelia Amado Amado

Solidão

"Solidão não é a falta de gente para conversar,
namorar, passear ou fazer sexo...
Isto é carência.
Solidão não é o sentimento que experimentamos pela
ausência de entes queridos que não podem mais voltar...
Isto é saudade.
Solidão não é o retiro voluntário que a gente se
impõe, às vezes, para realinhar os
pensamentos...
Isto é equilíbrio.
Solidão não é o claustro involuntário que o destino
nos impõe compulsoriamente para que
revejamos a nossa vida...
Isto é um princípio da natureza.
Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado...
Isto é circunstância.
Solidão é muito mais do que isto.
Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e
procuramos em vão pela nossa alma."

Chico Buarque

terça-feira, 9 de agosto de 2011

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Diversidade

Pensamento do dia!!!

Um homem não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em outra. A vida é um todo indivisível.

(Mahatma Gandhi)

Cavalinho, cavalinho

Corria o meu cavalinho
quando acordei de repente
Mas que lindo cavalinho!
Tinha a brancura do linho,
e um olho muito verdinho
fluorescente.

Corria, corria, corria, corria,
corria e espinoteava,
galopava e relinchava
numa autêntica euforia.

Corria, corria, corria, corria,
e de repente estacava,
e novamente corria,
corria e espinoteava
numa doida correria.
E em cada vez que corria,
E em cada volta que dava,
sua crina se agitava,
se espargia e sacudia
num jeito que se diria
ser assim que lhe agradava,
ter prazer no que fazia.
E o cavalinho corria,
corria sempre, corria,
na senda que rescendia
na manhã do laranjal.
O solo fofo gemia.

Brandos, os ramos teciam
acenos de ritual.
Tenros, os pomos tremiam
no compasso musical.

Sobre a garupa de neve,
abraçado ao seu pescoço,
eu era uma pena leve
soprada com alvoroço.

Se ele corria, eu corria,
se ele saltava, eu saltava,
tudo quanto ele fazia,
todas as voltas que dava,
tudo, tudo eu repetia,
na mesma doida euforia
que cansava e não cansava.

Mas que lindo cavalinho!
A sua crina macia,
loira de barbas de milho,
deixava um estendal de brilho
na senda que percorria.
Apetecia mexer-lhe,
sentir-lhe o fofo e o calor
daquela crina macia
que agitava e sacudia
como um doirado vapor.
Mas que lindo cavalinho!
Meu amor!

Não tinha sela nem brida,
nem cabeçada nem freio,
nem qualquer espécie de arreio
que lhe ofendesse a nudez.
Era um ser vivo total,
num emaranhado de vida
num gozo todo animal:
crina de loiro brunida,
corpo de branco cendal,
cascos da ágata polida,
ferraduras de cristal.

Mas que lindo cavalinho!
Senti-lhe o bafo cheiroso,
o tumulto harmonioso
do trote das nédias ancas.
Chamei-lhe os mais lindos nomes:
flor de nata, lua cheia,
floco de espuma na areia.
poço de camélias brancas
Beijei-lhe o focinho ardente,
mordisquei-lhe o corpo nu.

(que eu sabia, intimamente,
que o cavalinho eras tu.)

António Gedeão

Vertigem

Quando sob o meu
está o teu corpo
e eu nado dentro
do desejo e enlaço

os teus ombros as ancas
e o dorso
enquanto o espasmo se faz
num outro abraço

Desprendo a boca
depois
no grito solto

Mordo-te os pulsos
ambos
no orgasmo

Volto ao de cima
da água
do meu gosto

Bebo-te a vertigem
e em seguida o hálito

 

Maria Teresa Horta

Olhos Castanhos

http://www.youtube.com/watch?v=sFhJskkG4AU

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A curiosidade começa à noite

Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.

Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito.
E nunca te escrevi nenhuns versos românticos.
Nem depois de acordar te procurei no leito
Como a esposa sensual do Cântico dos cânticos.

Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo
A tua cor sadia, o teu sorriso terno,
Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso
Que me penetra bem, como este sol de inverno.

Passo contigo a tarde e sempre sem receio
Da luz crepuscular, que enerva, que provoca.
Eu não demoro o olhar na curva do teu seio
Nem me lembrei jamais de te beijar na boca.

Eu não sei se é amor. Será talvez começo...
Eu não sei que mudança a minha alma pressente...
Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço,
Que adoecia talvez de te saber doente.

Lua absurda, s/ autor referenciado
http://oblogdalibelua.blogs.sa​po.pt/arquivo/2004_05.html

Pensamento do dia!!!

"Quem não te procura, não sente a tua falta. Quem não sente a tua falta, não te ama. O destino determina quem entra na tua vida, mas tu decides quem fica nela. A verdade dói só uma vez. A mentira cada vez que te lembras. Então, valoriza quem te valoriza e não trates como prioridade quem te trata como opção."

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Tarde demais?

Um dia vou descobrir-te
Perder-me no teu horizonte
Brilhar no teu sol
Poisar no teu ombro.
Ficar ao teu lado para sempre.

Peguei num pincel e:
Surgiu-me o mar;
Surgiu-me a lua;
Surgiu-me o sol.
Porquê a lágrima

Com tanta claridade?

Olhei para o passado e perguntei:
‘onde estás?’
Ele não me respondeu…
Queres dizer-me tu?


Encontrei-te na música
Encontrei-te nas memórias
Encontrei-te no meu coração.
Perdi-me na noite
Perdi-me no passado
Perdi-me na dor
Perdi-me na oração
Perdi-me em ti.

O vento sopra
Afasto a ausência
Abro os braços
Aguardo a presença
Sei que não partiste.

Nunca é tarde demais.


Helena Moniz

O Menestrel

Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma. E você aprende que amar não significa apoiar-se. E que companhia nem sempre significa segurança. Começa a aprender que beijos não são contratos e que presentes não são promessas.

Começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.

Aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão.

Depois de um tempo você aprende que o sol queima se ficar exposto por muito tempo.

E aprende que, não importa o quanto você se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam… E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso. Aprende que falar pode aliviar dores emocionais.

Descobre que se leva anos para construir confiança e apenas segundos para destruí-la…

E que você pode fazer coisas em um instante das quais se arrependerá pelo resto da vida. Aprende que verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias.

E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida.

E que bons amigos são a família que nos permitiram escolher.

Aprende que não temos de mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam…

Percebe que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos. Descobre que as pessoas com quem você mais se importa na vida são tomadas de você muito depressa… por isso sempre devemos deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas; pode ser a última vez que as vejamos. Aprende que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, mas nós somos responsáveis por nós mesmos. Começa a aprender que não se deve comparar com os outros, mas com o melhor que pode ser.

Descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa que quer ser, e que o tempo é curto.

Aprende que não importa onde já chegou, mas para onde está indo… mas, se você não sabe para onde está indo, qualquer caminho serve.

Aprende que, ou você controla seus atos, ou eles o controlarão… e que ser flexível não significa ser fraco, ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, sempre existem, pelo menos, dois lados. Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências. Aprende que paciência requer muita prática.

Descobre que algumas vezes a pessoa que você espera que o chute quando você cai é uma das poucas que o ajudam a levantar-se. Aprende que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que se teve e o que você aprendeu com elas do que com quantos aniversários você celebrou. Aprende que há mais dos seus pais em você do que você supunha.

Aprende que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são bobagens…

Poucas coisas são tão humilhantes e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso.

Aprende que quando está com raiva tem o direito de estar com raiva, mas isso não te dá o direito de ser cruel. Descobre que só porque alguém não o ama do jeito que você quer que ame não significa que esse alguém não o ama com tudo o que pode, pois existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso.

Aprende que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém…

Algumas vezes você tem de aprender a perdoar a si mesmo.

Aprende que com a mesma severidade com que julga, você será em algum momento condenado.

Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte. Aprende que o tempo não é algo que possa voltar.

Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, em vez de esperar que alguém lhe traga flores.

E você aprende que realmente pode suportar… que realmente é forte, e que pode ir muito mais longe depois de pensar que não se pode mais. E que realmente a vida tem valor e que você tem valor diante da vida! Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar se não fosse o medo de tentar.

William Shakespeare

O Menestrel -- William Shakespeare

http://www.youtube.com/watch?v=WFWALDC0mxk

Pensamento do dia!!!

Toda a gente se queixa de assédio sexual no local de trabalho.
Ou isto começa a ser verdade ou então despeço-me…

Don't Worry Be Happy

http://www.youtube.com/watch?v=d-diB65scQU

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Pensamento do dia!!!

O teu computador é como uma carroça: tem sempre um burro à frente!!!

Beleza singela

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: <Fui eu?>
Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

Quando estou só reconheço

Quando estou só reconheço
Se por momentos me esqueço
Que existo entre outros que são
Como eu sós, salvo que estão
Alheados desde o começo.

E se sinto quanto estou
Verdadeiramente só,
Sinto-me livre mas triste.
Vou livre para onde vou,
Mas onde vou nada existe.

Creio contudo que a vida
Devidamente entendida
É toda assim, toda assim.
Por isso passo por mim
Como por cousa esquecida.

Fernando Pessoa

A agua ... corre

terça-feira, 19 de julho de 2011

Modernices

‎- Um homem chega a casa e vê a mulher deitada na cama com outro homem e diz:

- Oh, modernices! Qualquer dia começas a fumar!

Pensamento do dia!!!

92% dos Portugueses são péssimos em Matemática...  Os outros 14% são mais ou menos.

Você é luz, é raio estrela e luar

http://www.youtube.com/watch?v=Q7Hm21necrk

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Pensamento do dia!!!

Fevereiro tem apenas 28 dias. É o mês em que as mulheres falam menos.

Divino poema erótico

'Satânico é meu pensamento a teu respeito, e ardente é o meu desejo
de apertar-te em minha mão, numa sede de vingança incontestável pelo que me fizeste ontem.
A noite era quente e calma e eu estava em minha cama, quando,
sorrateiramente, te aproximaste. Encostaste o teu corpo sem roupa no
meu corpo nu, sem o mínimo pudor! Percebendo minha aparente indiferença,
aconchegaste-te a mim e mordeste-me sem escrúpulos. Até nos mais íntimos lugares.
Eu adormeci.
Hoje quando acordei, procurei-te numa ânsia ardente, mas em vão. Deixaste em
meu corpo e no lençol provas irrefutáveis do que entre nós ocorreu durante a noite.
Esta noite recolho-me mais cedo, para na mesma cama te esperar. Quando
chegares, quero te agarrar com avidez e força. Quero te apertar com todas as
forças de minhas mãos. Só descansarei quando vir sair o sangue quente do teu corpo.
Só assim, livrar-me-ei de ti, mosquito Filho da Puta! '

Drummond de Andrade Mosquito

terça-feira, 12 de julho de 2011

Pensamento do dia!!!

Que bom seria se os políticos apanhassem febre aftosa… desta forma, teríamos que sacrificar o rebanho inteiro.

If You Need Me

http://www.youtube.com/watch?v=ZXws6vBNaHc&

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Pensamento do dia!!!

A vida é maravilhosa. Sem ela, estaríamos todos mortos.

Holding Back The Years

http://www.youtube.com/watch?v=hQCxX_1QRgk

Vaidosa

Dizem que tu és pura como um lírio
E mais fria e insensível que o granito,
E que eu passo aí por favorito
Vivo louco de dor e de martírio.

Contam que tens um modo altivo e sério,
Que és muito desdenhosa e presumida,
E que o maior prazer da tua vida,
Seria acompanhar-me ao cemitério.

Chamam-te a bela imperatriz das fátuas,
A déspota, a fatal, o figurino,
E afirmam que és um molde alabastrino,
E não tens coração como as estátuas.

E narram o cruel martirológio
Dos que são teus, ó corpo sem defeito,
E julgam que é monótono o teu peito
Como o bater cadente dum relógio.

Porém eu sei que tu, que como um ópio
Me matas, me desvairas e adormeces
És tão loira e dourada como as messes
E possuis muito amor... muito amor próprio.

Cesário Verde

A débil

Eu, que sou feio, sólido, leal,
A ti, que és bela, frágil, assustada,
Quero estimar-te, sempre, recatada
Numa existência honesta, de cristal.

Sentado à mesa dum café devasso,
Ao avistar-te, há pouco, fraca e loura,
Nesta Babel tão velha e corruptora,
Tive tenções de oferecer-te o braço.

E quando socorreste um miserável,
Eu, que bebia cálices de absinto,
Mandei ir a garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, saudável.

"Ela aí vem!", disse eu para os demais;
E pus-me a olhar, vexado e suspirando,
O teu corpo que pulsa, alegre e brando,
Na frescura dos linhos matinais.

Via-te pela porta envidraçada;
E invejava - talvez que o não suspeites! -
Esse vestido simples, sem enfeites,
Nessa cintura tenra, imaculada.

Ia passando, a quatro, o patriarca.
Triste eu saí. Doía-me a cabeça.
Uma turba ruidosa, negra, espessa,
Voltava das exéquias dum monarca.

Adorável! Tu muito natural
Seguias a pensar no teu bordado;
Avultava, num largo arborizado,
Uma estátua de rei num pedestal.

Sorriam nos seus trens os titulares;
E ao claro sol guardava-te, no entanto,
A tua boa mãe, que te ama tanto,
Que não te morrerá sem te casares!

Soberbo dia! Impunha-me respeito
A limpidez do teu semblante grego;
E uma família, um ninho de sossego,
Desejava beijar sobre o teu peito.

Com elegância e sem ostentação,
Atravessavas, branca, esbelta e fina,
Uma chusma de padres de batina
E de altos funcionários da nação.

"Mas se a atropela o povo turbulento!
Se fosse, por acaso, ali pisada!"
De repente, paraste embaraçada
Ao pé dum numeroso ajuntamento.

E eu, que urdia estes fáceis esbocetos,
Julguei ver, com a vista de poeta,
Uma pombinha tímida e quieta
Num bando ameaçador de corvos pretos.

Efoi, então, que eu, homem varonil,
Quis dedicar-te a minha pobre vida,
A ti, que és ténue, dócil, recolhida,
Eu, que sou hábil, prático, viril.

Cesário Verde

Soneto do cativo

Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias
tão longe da verdade e da invenção;

o espelho deformante; a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que outros dirão ou não dirão;

se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;

não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!

David Mourão Ferreira

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Pensamento do dia!!!

Fazer aniversários faz bem à saúde… As pessoas que fazem muitos aniversários vivem mais.

Natura...

O amor é uma companhia

O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.

Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.

Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.

Alberto Caeiro

Segue o teu destino

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Ricardo Reis

Natura...

quarta-feira, 22 de junho de 2011

A mulher mais bonita do mundo

estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram
flores novas na terra do jardim, quero dizer
que estás bonita.

entro na casa, entro no quarto, abro o armário,
abro uma gaveta, abro uma caixa onde está o teu fio
de ouro.

entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como
se tocasse a pele do teu pescoço.

há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim.

estás tão bonita hoje.

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

estás dentro de algo que está dentro de todas as
coisas, a minha voz nomeia-te para descrever
a beleza.

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

de encontro ao silêncio, dentro do mundo,
estás tão bonita é aquilo que quero dizer.

José Luís Peixoto

Esta Noite Morrerás

Esta noite morrerás.
Quando a lua vier tocar-me o rosto
terás partido do meu leito
e aquele que procurar a marca dos teus passos
encontra urtigas crescendo
por sobre o teu nome.
Esta noite morrerás.
Quando a lua vier tocar-me o rosto
terás partido do meu leito
e uma gota de sangue ressequido
é a marca dos teus passos.
No coração do tempo pulsa um maquinismo ínscio
e na casa do tempo a hora é adorno.
Quando a lua vier tocar-me o rosto a tua sombra extinta marca
o fim de um eclipse horário de uma partida iminente e o tempo
apaga a marca dos teus passos sobre o meu nome.
Constante.
O mar é isso.
A lua vir tocar-me o rosto e encontrar urtigas crescendo
por sobre o teu nome.
O mar é tu morreste.
O mar é ser noite e vir a lua tocar-me o rosto quando tu par-
tiste e no meu leito crescem folhas sangue.
A febre é uma pira incompreensível como a aparição da lua
e a opacidade do mar.
No meu leito a lua vai tocar-me o rosto e a tua ausência é um
prisma, um girassol em panóplia.
Agora a lua chega devagar e o mar é o leito de tu teres
partido, uma infrutescência de eu procurar a marca dos teus
passos por sobre o meu rosto.
A noite é eu procurar a marca dos teus passos.
Esta noite a lua terá um halo de concêntricas florações
de gotas do teu sangue e a irisada sombra do meu leito
é o teu rosto iminente.
A lua é uma seta.
Tu partiste é o silêncio em forma de lança.
Esta noite vou erguer-me do meu leito e quando a lua vier
tocar-me o rosto vou uivar como um lobo.
Vou clamar pelo teu sangue extinto.
Vou desejar a tua carne viva, os teus membros esparsos,
a tua língua solta.
O teu ventre, lua.
Vou gritar e enterrar as unhas nos teus olhos até que
o mar se abra e a lua possa vir tocar-me o rosto.
Esta noite vou arrancar um cabelo e com a tua ausência faço
um pêndulo para interrogar a lua por tu teres partido e a marca
dos teus passos ser a razão mágica de a lua poder surgir de
noite e urtigas crescerem no meu leito.
E se encontrar a marca dos teus passos vou crivar-lhe
o coração de alfinetes para que tu partiste seja a razão
mágica de tu poderes morrer-te.
Quando a lua vier em forma de lança vai trespassar um pássaro
para lhe ler nas entranhas a direcção tu partiste e a marca dos
teus passos consiste nos olhos abertos de um pássaro esventrado.
Ah, mas o luar é uma pluma do meu leito e a lua é o colo de
tu morreste para poderes enfim tocar-me o rosto.

Ana Hatherly

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Pensamento do dia!!!

A razão pode te mostrar o caminho a seguir, mas só o coração te dirá o que deves fazer!!!

sexta-feira, 17 de junho de 2011

O pescador

Sábado, como de costume, levantei-me cedo, coloquei os meus agasalhos, vesti-me silenciosamente, tomei o meu café e até fui dar um passeio com o cão.
Em seguida, fui até a garagem e engatei o barco de pesca no meu Jeep.
De repente, começou a chover torrencialmente.
Havia até neve misturada com a chuva, ventos a mais de 80 km/h.
Liguei o rádio e ouvi que o tempo seria de frio e chuva durante todo aquele dia.
Voltei imediatamente para casa. Silenciosamente tirei a roupa e deslizei rapidamente para debaixo dos cobertores. Afaguei as costas da minha mulher, suavemente e disse-lhe baixinho: 'O tempo lá fora está terrível'.
Ela, ainda meio adormecida, respondeu:
"Acreditas que o cabrão foi pescar com este tempo ??

Indian Mantra

http://www.youtube.com/watch?v=Ze_Wh-QYNOI

Om Mani Padme Hum

http://www.youtube.com/watch?v=TDUdT5z_CBU

Pensamento do dia!!!

As palavras não regem a nossa vida, mas sim os actos.

Wonderfull tonight

http://www.youtube.com/watch?v=ZctjBM16dAc

Vinham rosas na bruma florescidas

Vinham rosas na bruma florescidas
rodear no teu nome a sua ausência.
E a si se coroavam, e tingiam
a apenas sombra de sua transparência.

Coroavam-se a si. Ou no teu nome
a mágoa que vestiam madrugava
até que a bruma dissipasse o bosque
e ambos surgissem só lugar de mágoa.

Mágoa não de antes ou de depois. Presente
sempre actual de cada bruma ou rosa,
relativos ou não no espelho ausente.

E ausente só porque, se não repousa,
é nome rodopio que, na mente,
em bruma a brisa em que se aviva a rosa.

Fernando Echevarría

Escrevemos docemente

Escrevemos docemente. Se a figura
sobe de estar tão funda a essa mesa
é que escrever se lembra. E só da altura
de se lembrar percorre a linha acesa

a ponta de escrever, que traça a pura
forma de rosto que abre na tristeza.
E a tristeza ilumina de escultura
penumbras de volumes com que pesa.

Por isso é docemente que da linha
de estar ali aonde sempre esteve
aparece figura de rainha

que sempre foi e agora só se escreve.
E escrevermos é como se na vinha
o sol se iluminasse. E fosse breve.

Fernando Echevarría

Se em nós a solidão viver sozinha

Se em nós a solidão viver sozinha,
sem que nada em nós próprios a perturbe,
cada figura passará rainha
na antiguidade súbita da urbe.

Um acento de pena irá na linha
vincar a eternidade de figura
a um rosto que quase só caminha
para dentro de o vermos pela pura

substância em si que vive a solidão
dentro de nós. E sendo nós só margem
do seu reino de ver por onde vão

as figuras passando na paisagem
de um antigo fulgor de coração
aonde passam desde sempre. E agem.

Fernando Echevarría

Colapso Económico, Fome e Miséria Programados e Iminentes

http://www.youtube.com/watch?v=ravfgMw-t2c

quarta-feira, 15 de junho de 2011

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Pensamento do dia!!!

Vive para não fazeres ninguém chorar... mas quando morreres que muita gente chore por ti e tu sejas a única a sorrir.

Hipócrita

Amor que morre

O nosso amor morreu... Quem o diria!
Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta
Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria...
E outro clarão, ao longe, já desponta!
Um engano que morre... e logo aponta
A luz doutra miragem fugidia...

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver
São precisos amores, pra morrer,
E são precisos sonhos pra partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso
Fazer do amor que parte o claro riso
De outro amor impossível que há-de vir!

Florbela Espanca

Ódio?

Ódio por ele? Não... Se o amei tanto,
Se tanto bem lhe quis no meu passado,
Se o encontrei depois de o ter sonhado,
Se à vida assim roubei todo o encanto...

Que importa se mentiu? E se hoje o pranto
Turva o meu triste olhar, marmorizado,
Olhar de monja, trágico, gelado
Como um soturno e enorme Campo Santo!

Ah! nunca mais amá-lo é já bastante!
Quero senti-lo d’outra, bem distante,
Como se fora meu, calma e serena!

Ódio seria em mim saudade infinda,
Mágoa de o ter perdido, amor ainda.
Ódio por ele? Não... não vale a pena...

Florbela Espanca

Os versos que te fiz

Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer!

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz!

Amo-te tanto! E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

Florbela Espanca

Tatoo - Olho de Hórus

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Esquerda ou direita?

Quando um tipo de direita não gosta das armas, não as compra.
Quando um tipo de esquerda não gosta das armas, quer proibi-las.

Quando um tipo de direita é vegetariano, não come carne.
Quando um tipo de esquerda é vegetariano, quer fazer campanha contra os produtos à base de proteínas animais.

Quando um tipo de direita é homossexual, vive tranquilamente a sua vida como tal.
Quando um tipo de esquerda é homossexual, faz um chinfrim para que todos o respeitem.

Quando um tipo de direita é prejudicado no trabalho, reflecte sobre a forma de sair desta situação e age em conformidade.
Quando um tipo de esquerda é prejudicado no trabalho, levanta uma queixa contra a discriminação de que foi alvo.

Quando um tipo de direita não gosta de um debate emitido por televisão, apaga a televisão ou muda de canal.
Quando um tipo de esquerda não gosta de um debate emitido por televisão, quer prosseguir em justiça contra os sacanas que dizem essas sacanices. Se for caso disso, uma pequena queixa por difamação será bem-vinda.

Quando um tipo de direita é ateu, não vai à igreja, nem à sinagoga, nem à mesquita.
Quando um tipo de esquerda é ateu, quer que nenhuma alusão à Deus ou à uma religião seja feita na esfera pública, excepto para o Islão (com medo de retaliações, provavelmente).

Quando um tipo de direita tem necessidade de cuidados médicos, vai ver o seu médico e, seguidamente, compra os medicamentos receitados.
Quando um tipo de esquerda tem necessidade de cuidados médicos, recorre à solidariedade nacional.

Quando a economia vai mal, o tipo de direita diz-se que é necessário arregaçar as mangas e trabalhar mais.
Quando a economia vai mal, o tipo de esquerda diz-se que os sacanas dos proprietários são os responsáveis e punem o país.

Tatoo

Corsário

Ainda que me ceguem os olhos
seguirei imaginando-te sempre.


Talvez me prendam
na cela dos rancores
- aquela que emudece
o amanhã.
Com pincéis imaginários
na tela da memória
pintarei teu rosto claro
como a estrela da manhã.


No navio do exílio
em breve estarei,
quem sabe condenado
pela afronta de querer-te,
querer-te mais
que o próprio rei.


Virá em meu auxílio
- tenho certeza -
o encanto
que já nasceu quedado
a acompanhar-me
feito guardião,
para afastar de mim
o perigo dos sete mares.


Sobreviverei incólume,
até inflar o peito
com aromas de perplexidade,
por saber-te vagando ainda
dentro do meu pensamento
entre correntes
que não prendem meus ares
de temível apaixonado.


Saltarei à frente do motim
para incendiar
o navio-prisão
e abrir as portas
da liberdade.


Voltarei para perpetrar
o destino clássico
dos aventureiros:
saquear o reino dos tiranos,
apoderando-se da jóia
mais valiosa...
teu coração clamando
pelo amor de tantos anos
guardados no âmago
das tempestades.

Flávio Villa-Lobos

Descoberta

Avisaram-me desde logo do risco
a que estaria exposto,
se eu fosse atingido em pleno rosto
pelo olhar certeiro
de um anjo caído na Terra,
que se afastou de sua rota original
devido ao imprevisto de haver
descoberto
- num rasgo de assombro -
ser possuidor
de um sentimento humano,
que não se sabe bem ao certo,
apresenta como único sintoma
sinais de intensa felicidade,
acompanhado de tremores
de paixão e, pasmem,
a característica de voar
sem tirar os pés do chão.


O olhar certeiro
encontrou-me distraído,
saindo de casa.


Quando dei por mim,
olhei para trás, sorrindo,
procurando minhas asas...

Flávio Villa-Lobos

Separação

Que estranho sentimento é este
que nos arrebata ferozmente
- sangria aberta
em postas de sangue virtual -
vergalhando a alma alquebrada,
chibata onipresente
do invisível feitor?


A dor que nos une
é a mesma do amor
quando se presume
o golpe final.

Flávio Villa-Lobos

Mistério

Uma só palavra tua
e o viver monótono
que me acompanha
ganhará as cores do arco-íris,
subirá as montanhas
do Nepal,
atravessará
a Cordilheira dos Andes,
cruzará o Canal da Mancha
e se perderá
no Triângulo das Bermudas.

Uma só palavra tua
e meus sentidos irão explorar
a Floresta Amazônica,
fotografar
o olho do furacão americano,
visualizar preces no Monte Sinai,
conferir a Muralha da China,
admirar as quedas do Niágara,
visitar as águas da romântica Veneza
e alcançar
as neves do Kilimanjaro.

Uma só palavra tua
e o muro de Berlim que me rodeia
cairá por terra,
libertando-me das garras
do inferno de Java,
abrirá minhas asas para o vôo de Ícaro
e, queimando meus temores,
fará pousar meus amores
na clareira recém-aberta, desenhada
pelo teu eterno sorriso
de Mona Lisa.

Flávio Villa-Lobos

Joia

terça-feira, 7 de junho de 2011

Escreve-me

Escreve-me! Ainda que seja só
Uma palavra, uma palavra apenas,
Suave como o teu nome e casta
Como um perfume casto d’açucenas!

Escreve-me!Há tanto,há tanto tempo
Que te não vejo, amor!Meu coração
Morreu já,e no mundo aos pobres mortos
Ninguém nega uma frase d’oração!

“Amo-te!”Cinco letras pequeninas,
Folhas leves e tenras de boninas,
Um poema d’amor e felicidade!

Não queres mandar-me esta palavra apenas?
Olha, manda então…brandas…serenas…
Cinco pétalas roxas de saudade…

Florbela Espanca

Se tu viesse ver-me

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...

Florbela Espanca

Lágrimas Ocultas

Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era querida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...

E a minha triste boca dolorida,
Que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!

E fico, pensativa, olhando o vago...
Tomo a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim...

E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!

Florbela Espanca

Noite de saudade

A Noite vem poisando devagar
Sobre a Terra, que inunda de amargura...
E nem sequer a benção do luar
A quis tornar divinamente pura...

Ninguém vem atrás dela a acompanhar
A sua dor que é cheia de tortura...
E eu oiço a Noite imensa soluçar!
E eu oiço soluçar a Noite escura!

Porque és assim tão escura, assim tão triste?!
é que, talvez, ó Noite, em ti existe
Uma saudade igual à que eu contenho!

Saudade que eu sei donde me vem...
Talvez de ti, ó Noite!... Ou de ninguém!...
Que eu nunca sei quem sou, nem o que tenho!

Florbela Espanca

Eu

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber por quê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

Florbela Espanca

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Dias... filhas


Eu ontem vi-te...

Eu ontem vi-te...
Andava a luz
Do teu olhar,
Que me seduz
A divagar
Em torno a mim.
E então pedi-te,
Não que me olhasses,
Mas que afastasses,
Um poucochinho,
Do meu caminho,
Um tal fulgor
De medo, amor,
Que me cegasse,
Me deslumbrasse
Fulgor assim.

Ângelo de Lima

Na rua

Ninguém por certo adivinha
como essa Desconhecida,
entre estes braços prendida,
jurava ser toda minha.

Minha sempre! — E em voz baixinha:
— «Tua ainda além da vida!...»
Hoje fita-me, esquecida
do grande amor que me tinha.

Juramos ser imortal
esse amor estranho e louco...
E o grande amor, afinal,

(Com que desprezo me lembro!)
foi morrendo pouco a pouco,
— como uma tarde em Setembro...

Manuel Laranjeira

Memória

Em meus momentos escuros
Em que em mim não há ninguém,
E tudo é névoas e muros
Quanto a vida dá ou tem,
Se, um instante, erguendo a fronte
De onde em mim sou aterrado,
Vejo o longínquo horizonte
Cheio de sol posto ou nado

Revivo, existo, conheço,
E, ainda que seja ilusão
O exterior em que me esqueço,
Nada mais quero nem peço.
Entrego-lhe o coração.

Fernando Pessoa

domingo, 5 de junho de 2011

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Não Desistas de Mim

http://www.youtube.com/watch?v=2n__plSXxaU&NR=1

Talvez

Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma
flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém
soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento,

E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei... Serás...Seremos...


Pablo Neruda

Seus Olhos

Seus olhos ... se eu sei pintar
O que os meus olhos cegou ...
Não tinham luz de brilhar.
Era chama de queimar;
E o fogo que a ateou
Vivaz, eterno, divino,
Como facho do Destino.


Divino, eterno! ... e suave
Ao mesmo tempo: mas grave
E de tão fatal poder,
Que, num só momento que a vi,
Queimar toda alma senti...
Nem ficou mais de meu ser,
Senão a cinza em que ardi.


Almeida Garrett

Partem tão tristes...

Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes, os tristes,
tão fora de esperar bem
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém

João Roiz de Castelo-Branco

Este Inferno de Amar

Este inferno de amar - como eu amo!
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói -
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembro: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...


Almeida Garret