quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Poema XLVIII

Deitei-me na tua cama
com as mãos cheias de nada.
Deitei-me na tua cama
sem saber da madrugada.
Deitei-me na tua cama
com minha pele tatuada
pelo silêncio das pedras
em água desesperada.

Senti perfumes, palácios,
palmas, promessas, países,
portos, poentes, palavras
nas minhas mãos infelizes.
Em momentos, em minutos,
cruzei mares, vi marés
e a mágoa maior de todas
de não saber quem tu és.

Deitei-me na tua cama
para beijar os teus pés.
Deitei-me na tua pele
como se fosse o cetim
dos lençóis do meu desejo
da fome de ter-te assim
e mergulhar no teu corpo
sempre à procura de mim.

E vi os braços dos pobres
erguendo luzes e chamas,
brilhos tirados do sol
que encheram todas as camas.
Senti os braços da noite
poisarem sobre os meus braços
quando tudo me pediste:
beijos, silêncios, cansaços.

Quando tudo tinha um nome
feito com fios de nada
eu dormi na tua cama
sem saber da madrugada,
fiz amor na tua cama
com minha pele tatuada
pelo silêncio das pedras
em água desesperada.


JOAQUIM PESSOA, in O POUCO É PARA ONTEM (Litexa, 2008)

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